Cirurgia boa é cirurgia segura! Práticas e protocolos
2 de out. de 2024
“Todo mundo erra
Todo mundo erra sempre
Todo mundo vai errar”
A arte imita a vida e, no famoso refrão da música, somos lembrados a todo momento de nossas imperfeições. Sabemos que o ser humano é incapaz de evitar completamente os erros, mas quando estamos falando de atividades críticas a nossa margem deve ser o mais próxima possível de zero.
Infelizmente nos deparamos vez ou outra com uma notícia extremamente triste de que um paciente foi submetido a um procedimento cirurgico equivocado ou no local equivocado. (https://g1.globo.com/pb/paraiba/noticia/2024/08/14/mae-denuncia-que-cirurgia-de-hernia-do-filho-foi-realizada-no-lado-errado-em-hospital-de-joao-pessoa.ghtml) e (https://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/hospital-amputa-perna-errada-de-paciente-no-rio-05102013/).
Apesar de rara, a frequência de eventos adversos como os relatados nas notícias não é desprezível, com uma média de ocorrência de 1300 a 2700 eventos por ano nos estados unidos entre 1990 e 2003 como pode ser observado nesse estudo (https://jamanetwork.com/journals/jamasurgery/fullarticle/398954)!
Ao propor um procedimento cirurgico aos meus pacientes, estou assumindo um compromisso e existe uma grande preocupação para realizar o melhor tratamento possível, o que inclui o procedimento correto no local correto.
Ricardo, agora eu fiquei preocupado! O que você faz para evitar isso?
A preocupação é legítima e deve ser levada a sério! Foram criados diversos protocolos institucionais que visam justamente prevenir esse tipo de acontecimento. Costumo fazer um paralelo com a rotina da aviação. Voar de avião é considerado uns dos meios de transportes mais seguros que existem, e você sabe por que? Existem diversos protocolos de segurança e tecnologias envolvidas para evitar desastres.
Durante o meu treinamento e durante toda a minha prática profissional, adoto medidas rígidas e padronizadas para que esse tipo de erro jamais aconteça com meus pacientes. Utilizo o protocolo de cirurgia segura universal conforme sugerido pela “Joint Comission” (https://www.jointcommission.org/standards/universal-protocol/), uma instituição internacional de acreditação e desenvolvimento de práticas de segurança em saúde.
Como funciona esse protocolo?
Antes do centro cirúrgico
A cirurgia segura começa muito antes do paciente chegar à sala de procedimento! Ao chegar no hospital, realizo uma visita ao paciente fora do ambiente do centro cirurgico e sem que qualquer medicação sedativa ou pré anestésica tenha sido administrada. Nesta visita, realizo uma revisão em conjunto com o paciente daquilo que combinamos no consultorio, o que inclui rever os exames, revisar o procedimento proposto, revisar o local e a lateralidade (no meu caso, qual joelho será operado) e as orientações pós operatórias.
A equipe de anestesia faz o mesmo procedimento (dupla checagem), checa o tempo de jejum (em geral de 6 a 8 h são o suficiente), alergias que o paciente tenha, procedimento, local e lateralidade.
Após essa dupla checagem, realizamos a marcação do sítio cirurgico com uma caneta especial para marcação de pele. O cirurgião (no caso eu), o anestesista, o paciente e seu acompanhante (ou enfermeiro do setor) são testemunhas dessa marcação de lateralidade.
Após a marcação, a equipe se dirige ao centro cirurgico para a próxima etapa.
No centro cirúrgico, antes do paciente chegar:
A próxima etapa é realizada antes do paciente ser levado para o centro cirurgico e inclui a verificação de todo o material necessário para a realização do procedimento. Em cirurgias ortopédicas, frequentemente checamos a disponibilidade dos implantes necessários para a cirurgia, assim como a disponibilidade do intensificador de imagem (aparelho de raio-x portátil). O paciente somente poderá ser chamado para a sala de cirurgia se todo o material estiver ok, estéril e disponível.
Após essa liberação do material, o paciente é, enfim, levado a sala para as próximas etapas.
No centro cirúrgico, após o paciente chegar:
Após a chegada do paciente, existem 3 momentos cruciais para a segurança do procedimento: o “sign in”, “time out” e o “sign out”! Estes são realizados de forma muito criteriosa.
No momento da chegada do paciente a sala de cirurgia, a enfermeira da sala checa a identificação (normalmente nome completo e data de nascimento), o nome do cirurgião que irá realizar a cirurgia, a marcação de lateralidade que foi realizada previamente e o termo de consentimento do procedimento.
Concluído o “sign in”, preparamos o paciente para o início da cirurgia. Após a colocação dos campos estéreis e imediatamente antes da primeira incisão ser realizada, realizamos o “time out” ou pausa cirúrgica. Neste momento, confirmo novamente a identidade do paciente, o local correto da cirurgia, a lateralidade correta e o procedimento correto. Checamos se as medicações necessárias foram realizadas, como o antibiótico para prevenção de infecção, se há reserva de CTI ou de hemocomponentes para transfusão em caso de necessidade e se o material está completo para a realização do procedimento.
Se, e somente se, todas as etapas estiverem corretas, iniciamos, enfim, a cirurgia.
Caramba Ricardo, quando rigor! Sim, cirurgia é coisa séria! Mas ainda não acabou... Ao final do procedimento cirúrgico é realizado o Sign out. Nele, a enfermeira da sala confirma com o cirurgião se o procedimento realizado foi o mesmo previsto, o número de compressas e gazes utilizadas (e se todas foram retiradas do paciente), os implantes utilizados e se houve alguma coleta de material (como culturas) e sua correta identificação.
Cirurgia é coisa muito séria e coloco a segurança dos meus pacientes em primeiro lugar! Todas essas etapas são SEMPRE realizadas e isso é inegociável. O meu compromisso com a saúde dos meus pacientes é o centro da minha prática médica.
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Dr. Ricardo Duran Sobral
CRM: 52 1106287
TEOT: 18355
RQE: 44191